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ESF POP RUA

Conheça essa história

Contaremos aqui algumas histórias que vivenciamos ao longo da nossa trajetória de trabalho. Os nomes aqui usados são fictícios visando a proteção e o cuidado dos nossos usuários.

"IMPORTA IMPORTAR"

História narrada pela enfermeira Luciana Marins, em 17/04/2013, após atender um paciente vítima de atropelamento no sábado (13/04) em outro município, estando agora em situação de rua, em nossa área de abrangência. sem condições de locomoção e com muita dor. Conseguimos a internação do paciente.


Hoje! Um dia a mais de busca por um justo cuidado ao cidadão em situação de rua. Lembrando por dever consciencial que cidadão é o “indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um estado livre”.

Impossível falar de qualidade dos serviços de saúde sem olhar de “um a um” com humanidade para prover cuidado profissional diferenciado.
Utopia? Não. Possibilidade real.

Acolher, lançar mão de procedimentos técnicos simples e encaminhar ao melhor destino terapêutico. Garantir a qualidade do atendimento. Acompanhá-lo no percurso. O que parece mínimo pode ser o ideal para reduzir o dano neste individuo acometido de doença física, psíquica e social.

Nas imagens abaixo encontramos um usuário crônico de álcool e drogas, vítima de atropelamento, incapacitado de realizar minimamente suas necessidades fisiológicas pela imobilização em membro inferior.

O diálogo terapêutico, a anamnese, verificação dos sinais vitais, identificação de outros sintomas clínicos e medicação analgésica, produziram um alívio imediato. A segurança de ser avaliado pela equipe de saúde que identificou a necessidade de internação hospitalar para tratamento clínico geral, faz gerar esperança de dias melhores.
Importa não desistir do ser humano. Importa lutar pela dignidade do atendimento. Importa importar! Importa CUIDAR.

Relato apenas “uma” experiência que faz crescimento profissional continuo a quem se destina a este mister. O Consultório na Rua é uma ação fértil. Uma ideia de amplitude única.

Vamos nos envolver com a realidade da nossa gente!


Enfermeira Luciana Marins.

Paciente com fratura na perna.

Enfermeira aferindo os sinais vitais do paciente.

Enfermeira verificando os sinais vitais.


Paciente sendo levado para internação.

Paciente na ambulância.
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"Restauração de Vínculo"

História narrada pelo Agente de Saúde Cléo Moraes
Os dados são os seguintes:
Nome: “Gomes” (Nome fictício)
Idade: 52 anos
Altura: 1.85
Peso: 132 Kg
Diagnóstico: Hipertenso e Diabético -Alcoolista e usuário de cocaína.

Faço parte do Esf Pop Rua há um ano e três meses. Cheguei ao serviço com uma difícil missão: substituir um agente que era muito carismático no trato com os usuários, Graças à minha ex-parceira, que facilitou muito minha aproximação com eles, comecei a me apropriar do trabalho. Apesar da minha experiência com o perfil de nossos usuários, visto que sou oriundo da Secretária Municipal de Assistência Social (SMAS), imediatamente me encantei com o retorno que a saúde  proporciona. No meu primeiro dia já levei à equipe técnica o caso de uma paciente que estava afastada do serviço por alguns dias e se encontrava  totalmente debilitada e neste dia  fui apresentado ao "Gomes", já que ele estava com feridas em ambas as pernas, acima do tornozelo e minha ex-parceira me sinalizou que ele precisava fazer curativo todos os dias  e que não era uma missão fácil, pois muita vezes, devido ao seu estado etílico, ignorava a pertinência do procedimento. Fiquei um pouco ressabiado ao falar com "Gomes", já que aquela figura "enorme" no primeiro momento, mostrou-se desconfiado e parecia me analisar. Ignorei a falta de receptividade e fui logo me apresentando e estendendo a mão. Olhei bem no fundo dos seus olhos e falei que ele poderia contar comigo de agora em diante. Após cumprido este ritual introdutório, "Gomes" esboçou algo que eu diria parecer um sorriso. Não poderia imaginar a importância que ele teria no decorrer do nosso trabalho.

Lembrá-lo do curativo e dos remédios para pressão arterial realmente era uma tarefa complicada. Sem falar que ele muitas vezes era impaciente e acabava criando algum  tipo  de transtorno na rotina da unidade e em razão deste fato, nosso ex-gerente sugeriu que alguém da equipe fosse com "Gomes" à sala de curativos, para evitar alguma ocorrência negativa, visto que infelizmente nossos usuários encontram muita resistência dos pacientes da unidade de saúde onde nosso programa funciona e também de determinados profissionais de saúde, pois eles  as vezes falam alto, o odor que exalam nem sempre é agradável  e ver pessoas em trajes sujos incomoda. Eles se ressentem desta hostilidade camuflada em olhares nada amistosos  e muitas vezes em atitudes ríspidas. Devido a revolta interior que suas trajetórias de vida tomaram, a agressividade acaba sendo uma forma de defesa. Após um destes episódios. "Gomes" falou que não voltaria mais. Que ele era gente e não precisava passar por aquele tipo de situação. Uma sensação de frustração e indignação se apoderou de mim e fiquei pensando em uma forma de reverter tal situação. Tive um insight. Faria de "Gomes" um parceiro do projeto. E foi o que eu fiz. Toda busca ativa (pois lidar com pacientes que não possuem moradia fixa e por vezes mudam de território não é fácil; contar com o apoio dos usuários é de vital importância), falava com "Gomes". Comecei a apresentá-lo aos outros como um grande parceiro do serviço. Que sua ajuda era fundamental para o nosso trabalho e surpreendentemente ele começou a agir como eu falava sobre ele. De repente começou  a monitorar os usuários que precisavam de ajuda e verdadeiramente tornou-se um "quase agente de saúde" do seu território.
Porém de tanto cuidar dos outros, "Gomes" acabava esquecendo de cuidar de si mesmo. Várias vezes os médicos pediam exames laboratórias e ele nunca comparecia. Imagina uma pessoa com o seu peso ficar doze horas em jejum! Em uma sexta feira, em nossa reunião de equipe, verbalizei minha angustia em relação à isto e toda equipe se mobilizou e uma grande maioria foi falar com ele e lembrá-lo da importância da realização dos exames. Conseguimos! Porém o que já imaginávamos se confirmou. "Gomes" é diabético. Como a rua tem uma rede própria de distribuição de alimentação gratuita, é muito complicado  para ele fazer dieta
.
Um dia, passando pela minha àrea, vi que "Gomes" estava tendo uma forte discussão com uma jovem, que ele falou que era sua filha, porém mais tarde soube que é "filha de consideração" e percebi que ele não estava bem. Pedi que ele fosse comigo à unidade, porém ele se recusou. Literalmente saí correndo pela Rua Henrique Valadares até chegar   à unidade e levei a técnica de enfermagem Gercina para aferir sua pressão. A sua  pressão arterial estava muito alta (210X150). Liguei para nossa gerente Laila Louzada e passei o caso e a mesma falou com o médico e deu instruções para a técnica de enfermagem trazer medicamentos ao local onde estávamos. Ficamos monitorando e após cinquenta minutos, sua PA estava 150X100. Após todo o estresse da situação, quando estava indo para outra micro área, passei para ver como ele estava E "Gomes" me abraçou e agradecido chorava como uma criança.

A maior lição que tiro desta história, é que "redução de danos" começa primeiro em nós. Como Brecht diz no poema  A  infanticida Maria Farrah, "Toda criatura humana, precisa da ajuda dos outros". Todos nós precisamos e merecemos ser amados e respeitados. Várias vezes recebo parabéns pelo nosso trabalho e isto soa estranho, pois todos nós estamos sujeitos à enfermidades e o que fazemos nada mais é do que fazer com que a nossa constituição se cumpra. "Gomes" hoje em dia, reduziu drasticamente o uso de álcool e cocaína  nunca mais fez uso. Quase sempre vem por conta própria buscar sua medicação e continua sendo uma peça fundamental em minha micro área. Suas pernas estão inchadas e  hoje ele já tem autonomia e por conta própria está se tratando no CMS São Francisco de Assis (HESFA), já que em nossa unidade não temos angiologista. Agora quem o agradece sou eu, pois à cada dia me dou conta que as experiências partilhadas são o melhor aprendizado e  fazem me tornar um profissional e ser humano melhor.

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"Medo de vacina"


História narrada pelos Agentes de Saúde Ana Maria Galdeano e Julio Cesar.
Paciente: Antonio José - Nome fictício -

"Antonio José" aderiu o nosso serviço á dois meses, quando nos aproximamos no Campo de Santana. por tês anos teve o vínculo familiar rompido por motivos diversos. Passou por diversos equipamentos da SMAS, conseguindo momentaneamente dar segmento à sua vida. Após este período, "Antonio José" teve uma recaída e ficou novamente em situação de rua onde conheceu o nosso serviço. Através da ESF POP RUA, retornou o cuidado de sua saúde onde encontrou em nossa equipe confiança para resolver suas demandas de saúde e sociais, onde verbaliza ser tratado com a dignidade de um cidadão brasileiro.
"Antonio José" narra um episódio curioso: desde criança não tomava nenhum tipo de vacina, isto em um período de mais de 40 anos, devido a falta de coragem. Após anos de insegurança, incentivado pelos agentes de saúde e através do vínculo estabelecido, "Antonio José" foi imunizado contra influenza, quebrando este tabu, que durava longos anos.
"Antonio José"vem fazendo sua parte, aderindo o tratamento com assiduidade e cumprindo as solicitações da equipe técnica, para que possa ter um diagnóstico preciso  sobre seu atual estado de saúde.


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PREMIAÇÃO DO CONCURSO DE BLOGS DA SAÚDE DA FAMÍLIA NA CATEGORIA CONHEÇA ESSA HISTÓRIA -REDE OTICS E SMSDC  1º Lugar






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História narrada pela enfermeira Laila Louzada
Estamos com um problema, uma paciente com tuberculose MDR, com inicio de tratamento em 2007 e vários abandonos, usuária de crack, veio encaminhada pela Fiocruz.


Os dados são os seguintes:
Nome: “Maria do Socorro” (Nome fictício)
Idade: 30 anos
1º tratamento 23/10/2007 - EI - alta por abandono em 17/12/2007
2º tratamento 17/12/2009 - EIII - Abandono
3º tratamento 04/03/2010 EIII - Abandono
Em 18/03/2010 foi internado no H. Santa Maria : BAAR +
27/10/2010 - internada no H. Santa Maria
Último BAAR (11/08/2011) ++
09/09/2011 internada no Hospital Ferreira Machado.
Evadiu em 21/09/11.


Entrei em contato com a gerência de TB que já conhecia o caso. Solicitei internação no hospital de Santa Maria, mas não tem vaga. Seria possível vaga no Hospital de Curicica.

A paciente “Maria do Socorro” foi acolhida pelo PSF Pop Rua com quadro respiratório grave, portando encaminhamento de outro serviço de atenção básica, com o seguinte diagnóstico: Tuberculose Multirresistente.
Já havia abandonado vários tratamentos, neste dia relatou muito desejo de ser internada, apesar de também alegar que tem dificuldade de permanecer nos hospitais devido à falta que sente de usar o crack. Quando disse que iria tentar uma vaga para internação, ela logo respondeu: "Não existe! Estou esperando a um tempo mas não tem vaga". A paciente estava certa, não havia nenhum leito para tuberculose multirresistente na cidade. Fui informada que só existem 10 leitos no hospital de Santa Maria reservados para este agravo (TB MR), sendo 2 femininos, que no momento estavam ocupados,  ou seja a chance de “Maria do Socorro” conseguir internação era muito pequena.
Fiz contato com Alexandre Milagres - médico infectologista do Hospital de Curicica - grande parceiro e militante da saúde pública, acompanha o nosso trabalho desde o início ajudando no tratamento de casos graves de tuberculose.
Ele com todo esforço conseguiu fabricar após alguns dias, um leito para esta paciente no Hospital de Curicica - adaptou um quarto para receber a paciente, convenceu a direção e a equipe do hospital quanto a gravidade do caso.  Quando ele me avisou da possibilidade de internação da paciente em Curicica a paciente não estava mais perto do posto.
Então, o email abaixo diz respeito aos outros desdobramentos da história:
Caro Alexandre,
hoje o dia foi intenso, acho importante registrar toda a "ginástica" que fizemos para conseguir uma internação, pois ela expressa o descaso político e o triste quadro da saúde pública na cidade do Rio de Janeiro.
Bom, depois da notícia que tivemos da existência de apenas 10 leitos destinados à pacientes de TB MR, a situação de “Maria do Socorro” ficou ainda mais alarmante. O esforço que você fez de conseguir fabricar um leito para esta paciente no hospital de Curicica é algo para ser lembrado como uma grande prova de militância pela vida. Todo este empenho e esforço nos contagiou do lado de cá e chegou até às ruas.  Faço questão de narrar os desdobramentos desta experiência, apesar de ainda estar um pouco emocionada com tudo que vivenciamos hoje a tarde e a noite.
Após a confirmação da fabricação do leito e toda as suas negociações com o SISREG para a garantia da vaga, a equipe do PSF de Rua se mobilizou no que pôde, um grupo foi para a Central do Brasil e outro para a Rodoviária em busca da paciente (locais que ela frequentava).
Passamos pela Praça Cruz Vermelha, identificamos um grupo de moradores de rua que conhecia “Maria do Socorro”, nos informaram que a mesma tinha sumido a alguns dias, um deles ofereceu ajuda pra procurá-la nas imediações da praça, pegaram o nosso telefone, caso encontrassem-na. Enquanto, isso partimos para a Central. Antes passamos no Hospital Souza Aguiar, sem notícias da paciente no acolhimento, resolvemos visitar a sala amarela, já que muitos dos nossos usuários dão o nome "errado" nos hospitais. Não achamos no hospital, mas deixamos os dados e características da paciente, informando a gravidade do caso para a assistente social e enfermeiros do acolhimento.
Chegamos a Central do Brasil, muitos dos nossos usuários deram informações sobre os possíveis locais de uso de crack, onde “Maria do Socorro” poderia estar. Identificamos algumas cenas de uso da droga, mas sem notícias da paciente. Visitamos uma igreja que abriga população em situação de rua, que por sinal é extremamente insalubre, e falamos sobre a importância de sinalizar o aparecimento da paciente e que ela não pode ficar ali naquele ambiente.
Enquanto isso, o outro grupo partiu do posto a pé até a Rodoviária, passando pela Leopoldina, aproximando de cada morador de rua para saber notícias de “Maria do Socorro”. Até que um amigo da paciente disse que ela estava na "boca" do Arará. Certificamos que se tratava da mesma pessoa, decidimos que seria importante ir até lá.
Partimos às 19:00 para Benfica, agora um grupo menor de 4 pessoas (eu, ACS Fábio Mosca; Assistente social Ana Lucia e o Enfemeiro Sebastian). Sem conhecer bem o território, já de noite, tivemos a sorte de encontrar logo na entrada da favela um rapaz que conhecia “Maria do Socorro” e a descreveu com detalhes. Ele se sensibilizou com a nossa presença e nos apresentou ao dono da boca, que permitiu a nossa entrada na cracolândia.
Estavámos todos identificados como profissionais de saúde, o que facilitou a entrada no espaço. Tratava-se de uma enorme cracolândia, na linha do trem, com aproximadamente 400 usuários de crack. Lá tive a sensação que o Estado não chegava, era outro mundo atrás dos muros, para chegar no local entramos em um buraco que os traficantes chamaram de "buraco dos cracudos" que saía na linha do trem. Meio às cenas de horror, ao solicitarmos a ajuda das pessoas na busca de “Maria do Socorro”, foi impressionante a emoção das pessoas, o cuidado e alegria que demostram com a nossa presença. Em um grupo de 40 pessoas em pleno uso da droga, alguns perguntaram sobre a Tuberculose, tiramos muitas dúvidas. Fiquei emocionada com o cenário, a carência e ao mesmo tempo a potência que temos nas mãos, quando ao invés de marcarmos a distância entre os mundos, ultrapassarmos os "buracos". Muitos nos ajudaram a procurar “Maria do Socorro” na linha do trem, até que um deles nos informou que o choque de ordem havia levado a paciente para Antares. Então, nos despedimos das pessoas, saímos da favela e fiz contato com Antares. Confirmei a presença de “Maria do Socorro” lá!
Ela está em um quarto isolado, em uso de máscara, segundo o educador social. E amanhã a equipe do abrigo levará a paciente para Curicica.
No final do dia, ainda indignada com a precariedade de nossa rede de saúde, fiquei surpresa e feliz com o retorno que tivemos das pessoas nas ruas e na cracolândia.
Feliz também por poder compartilhar com você e com a nossa equipe este trabalho. Parabenizo os nossos esforços e reforço a necessidade de criarmos novos mecanismos de construção e articulação em rede, de comunicação e divulgação das problemáticas que enfrentamos no dia a dia dos serviços públicos.


Obrigada,
Laila Oliveira Louzada
Enfermeira e Gerente Técnica do ESF Pop Rua



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História narrada pela Agente Comunitária de Saúde Ana Maria Bezerra Galdeano

A HISTÓRIA DE BELA
Bela uma mulata de cerca de 1,65m, 60 anos, ex-residente de Jacerepaguá é uma mulher muito bonita.
Ela foi casada, teve uma boa casa e família e dessa relação nasceram dois meninos. Hoje um deles está desaparecido por ter se envolvido com o tráfico e o outro casou-se e lhe deu dois netos.
Na década de 70, Bela trabalhou como uma das mulatas de Sargentelli viajando para Buenos Aires para apresentar-se em shows.
Após a época glamourosa, Bela foi trabalhar em uma das Boates da Praça Mauá como bailarina de streap tease e iniciou o seu processo de decadência.



Pois lá conheceu as drogas lícitas e ilícitas, se envolveu com vários homens e muitos deles vindos de outros países (marinheiros), que desembarcavam no Cais do Porto. Bela começou a se prostituir para ter um local para dormir, tomar banho, se alimentar e poder se proteger de vários tipos de violência - moral, física, psicológica - e da indiferença que acontece e que muitas vezes são ignoradas. 
Hoje,  encontra-se na lateral da Central do Brasil, com comprometimentos físicos e mentais, na verdade em situação de vulnerabilidade e de total abandono. Bela nos seus momentos de lucidez, sonha em ter alguém que possa realmente ama-lá e lhe dar tudo aquilo que um ser humano merece:  uma vida com dignidade.